Em meio à crise ecológica, os eventos climáticos recrudescem na mesma medida do negacionismo e da inação multilateral. Fundados no neofascismo e no populismo autoritário, os líderes políticos extremistas ascendem e ganham cada vez mais poder, aprofundando a crise das democracias... Há uma mistura perigosa de conservadorismo religioso, extremismo político e necrocapitalismo neoliberal, em relações perversas de apoio mútuo e retroalimentação.
Há uma esquerda melancólica que se mostra incapaz de propor novos projetos e alternativas viáveis de outros futuros possíveis. Triste e estranhamente, a extrema-direita capturou o discurso contestatório e libertário, anti-status quo.
Preocupado com os cenários desoladores, o Papa Francisco resolveu convocar o Jubileu da Esperança, para aprofundar essa dimensão cristã da fé: “A imprevisibilidade do futuro faz surgir sentimentos por vezes contrapostos: desde a confiança ao medo, da serenidade ao desânimo, da certeza à dúvida... Que o Jubileu seja, para todos, ocasião de reanimar a esperança!”.[3]
Como reanimar a esperança em um mundo marcado pelo terror das guerras na Ucrânia e em Gaza, ... diante das matanças incessantes e da violência impiedosa que afeta países inteiros como o Sudão do Sul, o Congo, o Haiti, o Iêmen?
Para o filósofo alemão Ernst Bloch era preciso cultivar os sonhos de libertação e apostar no potencial de transformação da utopia. Não se trata aqui de uma esperança passiva, que adormece a consciência crítica..., mas uma esperança instruída, consciente, reflexiva. A verdadeira esperança exige engajamento e ação política efetiva para transformar a realidade.
É crível pensar em um futuro alternativo para o cristianismo se uma robusta maioria silenciosa do clero e do episcopado rema na direção contrária daquela inspirada pelo Papa Francisco? Depois de seus documentos pontifícios especialmente poderosos, o que efetivamente mudou no modo de ser Igreja das dioceses e paróquias mundo afora?
Apesar da interessante iniciativa do papa de convocar o Ano Santo da Esperança, em muitas Igreja locais as inquietantes provocações e propostas de Francisco foram capturadas por uma agenda circunscrita a e encharcada de práticas piedosas e devocionais... Consegue-se imaginar outras linguagens, outras imagens, outros modelos?
Diante desses cenários catastróficos, capitular não é uma opção. Se famílias palestinas, lideranças indígenas e mulheres da Igreja persistem no seu caminhar pela libertação, como se pode desesperançar e ceder ao desespero? Perscrutando as auroras do mundo deve-se adotar um otimismo militante que trabalha diuturnamente pela utopia concreta de um mundo mais justo, fraterno e igualitário.
E, então, se poderá cantar junto com o bispo-profeta da Igreja profundamente comprometida com as causas sociais: "Amanhece./ E a noite foi longa./ Mas amanhece./ E a noite não venceu./ Amanhece./ E nós estamos vivos". – Pedro Casaldáliga
Nota: Tirado do artigo de Gabriel Vilardi https://www.ihu.unisinos.br/650432-esperanca-teimosa-utopia-ou-desencarnada-alienacao-artigo-de-gabriel-vilardi